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Desafios para os herdeiros da agricultura familiar – COLUNA Vera Gurgel

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por Vera Lúcia Lourenço Gurgel

Em primeiro lugar, minha gratidão ao Juruá Online por me confiar esse espaço.

É um espaço que não defende linhas partidárias, mas somente, alguns caminhos que possam contribuir para fazer uma juntada de coisas, que possam buscar luz para futuras vitórias, que levem às conquistas para o agronegócio, independentemente do tamanho da sua propriedade.

A população rural, é composta por 201.280 pessoas (fonte Acre em Números, 2017), representa um índice de 37,44 % da população total do Estado do Acre.

Desse total, aproximadamente 25 %, são os jovens com idade entre 16 a 29 anos, após alguns estudos que realizamos há um tempo.

Sou extensionista da Emater Acre há 44 anos, e consultora liberal em outras demandas. Tenho percorrido todo o Estado do Acre, exercendo atividades que possam contribuir para o desenvolvimento local, e o empreendedorismo rural para uma grande parcela da população ribeirinha, comunidades rurais, comunidades indígenas passando por todos os municípios. Tenho encontrado e percebido o “envelhecimento “ dos produtores rurais, e ainda a perpetuação de muitas práticas rudimentares- pensando em século XXI- necessário para a produção. Nos próximos 10 anos, corre-se o risco desses produtores não terem mais força e vigor físico para continuar suas atividades, que são árduas.

E quem vai continuar essas atividades?

Ao final dos anos 70, existia na política de governo do Estado do Acre, os Núcleo de Apoio Rural Integrado ( NARI´s ),   com o objetivo de manter as famílias no seu módulo e modo de produção, com projetos de crédito, desenvolvimento social, e atividades voltadas para a juventude rural, através da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Acre-EMATER-ACRE . Nessa época, não se falava em empreendedorismo, ou empreendedorismo rural.

Nos anos 90, essas políticas tanto a nível estadual e nacional, foram relegadas ao segundo plano, e praticamente seccionadas em atividades desvinculadas do escopo do desenvolvimento regional, passando a ser apenas creditícias.

Essas políticas caíram invariavelmente na inadimplência, e o que vemos todos os anos, é a anistia, ou propostas de refinanciamento para novos financiamentos.

Essa prática vem oportunizando um processo de estabelecimento contundente e inversamente proporcional ao empreendedorismo, haja vista a falta de fechamento das cadeias de produção, acesso ao mercado, produção sustentável para que as famílias tenham uma visão de futuro. Quem é o futuro? O futuro é a juventude rural. Como os herdeiros da agricultura familiar estão percebendo isso? 

A juventude rural, está sem política, e sem atividades que levem ao investimento de melhoria da herança posta aos mesmo, em suas propriedades rurais. A maioria não quer herdar dos pais, o sol quente, períodos de chuvas recorrentes na região e as dificuldades para produzir, escoar e comercializar seus produtos.

Ao verificar a falta de visão de futuro, o jovem desiste de continuar a atividade familiar e o que vemos para esse futuro, é a decadência vertiginosa da agricultura familiar, a continuação dos empreendimentos rurais, e consequentemente, a porta aberta para o crescimento do latifúndio, o inchaço urbano e o crescimento de problemas sociais.

Temos um quantitativo de 80 mil pessoas de 15 anos ou mais ocupadas por referência e agrupamento de atividades e posição do trabalho principal, representando significativamente (grifo nosso), um percentual de 24,64%. Segundo a posição na ocupação na produção para o próprio consumo, um percentual de 7,76% e um percentual não remunerado de 6,14%.

Analisando esses percentuais, percebemos que ao somarmos os que produzem para o seu próprio consumo e os que não são remunerados, temos um percentual de 13,90%, onde já se pode prever que ao longo dos anos, essa tendência poderá ser analisada da seguinte forma: os que produzem para o consumo próprio buscarão outra maneira de atender suas necessidades, e os que produzem sem remuneração, também buscarão outra forma para subsistir.

Os jovens não querem mais continuar no ‘sacrifício’ visto e vivenciado por seus pais, e a ideia é a de estudar (que é excelente) para ter um emprego público, ou vir para a cidade em busca de ocupação na iniciativa privada.

Deixar a continuidade da agricultura familiar de lado, é destinar o desenvolvimento local e   regional ao fracasso produtivo e social 

Nesse sentido, é preciso pensar em ações para serem desenvolvidas a médio e longo prazo, como um caminho sugerido para abordar essas questões.

​É importante a construção de política pública estadual que abarque o assunto empreendedorismo rural, voltado com mais força para os jovens rurais, com foco naelaboração de uma proposta de desenvolvimento rural com foco empreendedor, selecionando algumas áreas para implementação e estudos inicias. 

A partir de dados reais, elaborar propostas de projetos voltados para apicultura, agricultura, pecuária, extrativismo, e beneficiamento da produção que agreguem valor e que tornem sustentável sua propriedade rural.  Aliado a isso, desenvolver propostas modernas de capacitação efetiva com foco na gestão empresarial, rural, produtos potenciais, mercado e negócios através da implementação de ferramentas de gestão empreendedora, através do estabelecimento de parcerias com instituições afins, captando recursos e desenvolver esses projetos, até fechar a cadeia produtiva e inclusive, com a oportunidade de fazer a gestão de recursos financeiros para gerenciamento de empréstimos das linhas PRONAF. Assim, várias competências e habilidades poderiam ser desenvolvidas para o público jovem rural. Não falta parceria para isso, pois temos a Secretaria de Estado de Produção e Agronegócio- SEPA, a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Acre- EMATER ACRE, EMBRAPA, UFAC, IFAC,  DERACRE, SEBRAE, SENAI, SENAR, e ONGS , como a SOS AMAZÔNIA , por exemplo. Como estratégias, pode-se fortalecer o fomento as feiras, rodada de negócios com a participação das redes de supermercados, instrumentalizar os atores principais, essa juventude rural, para potencializarem suas competências e desenvolverem visão de futuro.

Como resultados esperados a médio e longo prazo, ter-se a jovens com competências desenvolvidas para o negócio rural, e empreendimentos rurais estabelecidos com sustentabilidade empresarial e ambiental, aumento da oferta de produtos oriundos da agricultura familiar com valor agregado atendendo a demanda local, e o principal: diminuição da venda de terras por conta da falta de gestão no campo, pois os jovens terão capacidade e competências desenvolvidas para o agronegócio à médio e longo prazo.

​Mas o resultado mais importante seria: pais felizes, por não verem o esforço de décadas sair das mãos da família para o latifúndio, herdeiros empreendedores livres rompendo o ciclo de virem morar nas periferias das cidades, e com olhar positivo para o futuro. Todo mundo sai ganhando. 

Vera Lúcia Lourenço Gurgel

*Economista Doméstica (UFV), Técnica Especialista em Extensão Rural da Emater- Acre , Especialista em: Comunicação e Metodologia, Capacitação de Recursos Humanos, Planejamento Regional e Políticas Públicas, Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente( UFAC), e amante da natureza , de gente, e da Amazônia.

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